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A DOCE ILUSÃO: DOCE DE LEITE NO PRÉ-TREINO.

A preocupação com a alimentação pré-treino tem ganhado destaque, sendo alvo de diversas abordagens e recomendações. No entanto, é crucial ir além do simples fornecimento de energia, considerando os potenciais efeitos deletérios para a formação de tecidos e a possível sobrecarga do sistema imunológico. Nesse contexto, a utilização do doce de leite como fonte de energia antes do exercício merece uma análise crítica, especialmente quando se leva em consideração a complexa interação entre os alimentos consumidos e os processos fisiológicos do corpo. A busca por fontes energéticas eficazes muitas vezes se concentra apenas nos benefícios imediatos, desconsiderando possíveis impactos negativos a longo prazo. É fundamental lembrar que o hormônio insulina, essencial na regulação do metabolismo, desempenha um papel crucial na anabolismo, sendo considerado o hormônio mais anabólico do corpo humano. Assim, qualquer intervenção alimentar que influencie significativamente os níveis de insulina deve ser cuidadosamente avaliada, levando em conta não apenas os ganhos imediatos, mas também os efeitos a longo prazo na saúde metabólica.


Ao analisarmos a perspectiva de que o doce de leite pode ser utilizado como pré-treino, é crucial considerar não apenas a quantidade de energia fornecida, mas também os potenciais efeitos sobre a resposta insulínica. A literatura científica destaca a importância de evitar sobrecargas de insulina, uma vez que desequilíbrios nesse hormônio podem não apenas impactar negativamente a formação de tecidos, mas também contribuir para o desenvolvimento de condições adversas, como resistência à insulina. Paralelamente, é relevante estabelecer uma conexão com outros elementos da dieta que podem influenciar a resposta metabólica, tais como aditivos alimentares. A discussão sobre os efeitos adversos de conservantes, como o sorbato de potássio, oferece uma perspectiva adicional para a compreensão dos desafios relacionados à alimentação pré-treino. A toxicidade desses conservantes não está apenas associada a possíveis problemas respiratórios e câncer, mas também aos hábitos alimentares estabelecidos, à idade e à frequência de consumo. Diante desse contexto, este artigo busca explorar criticamente a proposta de utilizar o doce de leite como fonte de energia pré-treino, considerando não apenas a dimensão imediata do fornecimento de energia, mas também os potenciais impactos sobre a formação de tecidos e o sistema imunológico. Em um cenário onde a insulina é reconhecida como um hormônio anabólico de extrema importância, é fundamental abordar com cautela qualquer prescrição ou teoria relacionada ao que deve ou não ser utilizado como preparação para o exercício físico. Afinal, a promoção da saúde e do desempenho atlético deve ser pautada em uma compreensão abrangente e equilibrada dos aspectos nutricionais e fisiológicos envolvidos.


O doce de leite, uma iguaria apreciada em diversas culturas, tem como base uma composição simples, combinando principalmente açúcar e leite. Encontrado em diferentes variações pelo mundo, o doce de leite pode ser preparado com leite de vaca, cabra ou ovelha, sendo a doçura característica proveniente do açúcar adicionado. Em algumas receitas, são incorporados adoçantes alternativos e aromatizantes, como baunilha ou canela, para realçar o sabor. A presença natural das gorduras do leite confere uma textura cremosa, podendo ser aprimorada em algumas versões com a adição de ingredientes gordurosos. Ademais, em produtos industrializados, podem ser incluídos estabilizantes e conservantes para prolongar a durabilidade. A diversidade de receitas e tradições culinárias proporciona uma ampla gama de sabores e texturas no universo do doce de leite. Sendo assim, levantamos a primeira questão quando se afirma que "doce de leite é bom para o pré-treino": Qual doce de leite? No contexto do sorbato de potássio, mencionado no segundo parágrafo, Dehghan et al. (2018) observaram que uma ingestão elevada, especialmente acima de 25 mg/kg, está correlacionada a efeitos citotóxicos e genotóxicos. Isso se traduz na formação de compostos mutagênicos e em alterações cromossômicas. Esses efeitos foram associados ao desenvolvimento de doenças crônicas, como diabetes mellitus e câncer (doi:10.1016/j.fct.2018.07.055). Nesse mesmo estudo, os resultados metabólicos indicaram que o sorbato de potássio (PS) é completamente absorvido após administração oral e posteriormente distribuído no corpo. Ele pode ser metabolizado e oxidado em dióxido de carbono (CO2) e água (H2O), semelhante ao ácido hexanoico, no corpo humano. Entre 80% e 86% do PS é exalado pelos pulmões na forma de CO2, e de 2% a 10% do PS é excretado na urina como ureia e em concentrações mais baixas como ácido mucônico e ácido sórbico. A excreção pelos pulmões é concluída após 10 horas de aplicação.


Na nutrição esportiva, o pico de insulina no pré-treino e os potenciais efeitos prejudiciais a longo prazo é um tópico relevante e debatido na literatura científica. A insulina é um hormônio anabólico que regula o metabolismo da glicose e o armazenamento de nutrientes, e sua liberação é influenciada pela ingestão de alimentos, especialmente carboidratos. Pesquisadores têm explorado como a manipulação da ingestão de nutrientes antes do treino pode afetar o desempenho e a adaptação ao exercício. Enquanto alguns estudos sugerem que o consumo estratégico de carboidratos antes do treino pode melhorar o desempenho, outros destacam preocupações sobre os efeitos a longo prazo, incluindo resistência à insulina e outras complicações metabólicas. A afirmação de que o consumo de doce de leite seria benéfico para a absorção da creatina devido à presença de carboidratos não é totalmente justificada quando consideramos a complexidade da composição do doce de leite em relação aos carboidratos de rápida assimilação. Embora seja verdade que a ingestão de carboidratos junto com a creatina pode potencializar sua absorção devido à liberação de insulina, é fundamental destacar que nem todos os carboidratos são iguais, e a composição do doce de leite vai além de ser simplesmente uma fonte de açúcar. Ao contrário de carboidratos como a dextrose, o doce de leite contém uma combinação de açúcares, lipídios e proteínas, formando uma matriz mais complexa. A presença de açúcares de rápida degradação nesse contexto, especialmente em indivíduos inflamados, pode desencadear a sinalização de COX-2, uma enzima envolvida na resposta inflamatória. Esta resposta inflamatória poderia interferir na formação eficiente de novas fibras musculares, prejudicando os processos de recuperação pós-exercício. A sinalização de COX-2, quando desregulada, pode levar à produção aumentada de prostaglandinas, mediadores pró-inflamatórios. Em um contexto inflamatório crônico, isso pode contribuir para um ambiente desfavorável à síntese de proteínas musculares e reparo tecidual. Portanto, a ideia de que o doce de leite, por sua composição específica, é ideal para promover a absorção de creatina pode ser questionável. É crucial ressaltar que a abordagem nutricional para otimizar a absorção de creatina não deve negligenciar os potenciais efeitos inflamatórios induzidos por certos alimentos, especialmente em contextos inflamatórios crônicos. Recomenda-se buscar orientação profissional específica, considerando as necessidades individuais e condições de saúde, para garantir que as estratégias nutricionais sejam eficazes e seguras.


A observação de que uma dose de doce de leite contém apenas 70 kcal destaca a importância de considerar não apenas a quantidade total de calorias, mas também a qualidade dos nutrientes, especialmente quando discutimos os efeitos em longo prazo e fatores inflamatórios. Embora o doce de leite possa ser relativamente baixo em calorias, é essencial analisar a composição dessas calorias. Alimentos processados, como doces, muitas vezes contêm açúcares refinados e gorduras saturadas, que, em longo prazo e em contextos inflamatórios, podem desencadear respostas inflamatórias indesejadas no organismo. Outra abordagem muito importante e vista diariamente em meu consultório é sobre compulsão por doces, que é um fenômeno comum e pode ser influenciada por diversos fatores, incluindo características individuais, emocionais, ambientais e até mesmo a composição dos próprios alimentos. No contexto do doce de leite, é importante considerar que sua combinação de açúcares e gorduras pode contribuir para a ativação de mecanismos neurológicos relacionados à recompensa e ao prazer, potencialmente levando a comportamentos compulsivos em relação ao consumo desse "alimento".


O doce de leite, como muitos doces, pode ter um perfil sensorial que ativa áreas do cérebro associadas ao prazer, o que pode levar a uma busca repetitiva por essa sensação de gratificação. Além disso, a presença de açúcares refinados pode desencadear picos de glicose no sangue, seguidos por quedas, contribuindo para a busca contínua por alimentos doces para restabelecer níveis de energia e humor. A compulsão por doces também pode estar ligada a fatores emocionais, como o uso de alimentos como uma forma de lidar com o estresse, ansiedade ou emoções negativas. O doce de leite, por sua natureza indulgente, pode tornar-se uma escolha frequente em momentos de desconforto emocional, criando um ciclo de comportamento compulsivo. É importante reconhecer que a compulsão por doces pode ter implicações para a saúde, incluindo o risco de ganho de peso, problemas metabólicos e desequilíbrios nutricionais. Recomenda-se a adoção de estratégias que promovam um relacionamento saudável com os alimentos, como a busca por alternativas mais equilibradas e o desenvolvimento de habilidades para lidar com as emoções de maneiras não alimentares. Consultar um profissional de saúde ou nutricionista pode ser benéfico para identificar padrões alimentares, compreender os gatilhos emocionais e desenvolver estratégias para gerenciar a compulsão por doces, contribuindo para uma abordagem mais equilibrada e sustentável em relação à alimentação. Ao relacionar essas descobertas ao efeito negativo do consumo do próprio leite, rico em lactose, é crucial considerar a composição desse produto em comparação com as intervenções dietéticas mencionadas anteriormente. O leite, assim como o doce de leite, contém lactose, um tipo de açúcar que, quando consumido em excesso, pode ter efeitos prejudiciais no metabolismo cerebral. A lactose é composta por glicose e galactose, e pesquisas, como destacado por estudos anteriores, indicam que o aumento no consumo desses açúcares pode levar a desequilíbrios no metabolismo energético cerebral, afetando marcadores cruciais como ATP, NAD, AMPK e Sir2. Estudos prévios ("Metabolic syndrome' in the brain: deficiency in omega-3 fatty acid exacerbates dysfunctions in insulin receptor signalling and cognition") evidenciam que uma dieta rica em açúcares, incluindo aqueles presentes na lactose, pode comprometer a plasticidade sináptica e reduzir a expressão de proteínas vitais, como Sir2, essenciais para a homeostase celular e o metabolismo energético. Ao consumir leite, seja diretamente ou como componente do doce de leite, que frequentemente contribui para a ingestão excessiva de açúcares, é plausível esperar um efeito semelhante de comprometimento no metabolismo cerebral, podendo afetar negativamente a função cognitiva. A relação entre o leite (rico em lactose) e esses marcadores metabólicos destaca os potenciais impactos negativos desse alimento sobre a saúde cerebral a longo prazo, incluindo distúrbios cognitivos e outros problemas associados ao desequilíbrio metabólico. Essa análise ressalta a importância de escolhas alimentares equilibradas para promover uma saúde cerebral ótima e destaca os riscos associados ao consumo excessivo de produtos lácteos ricos em açúcares, como o leite e seus derivados, incluindo o doce de leite.


Laura (nome fictício), desde a infância, viu no doce de leite uma fonte de conforto e prazer. A relação inicialmente inocente com essa guloseima se transformou em um vício por açúcar ao longo dos anos. A história de Laura destaca como escolhas alimentares da infância podem influenciar padrões de consumo e impactar a saúde. Agora, imagine essa narrativa em um contexto esportivo, onde produtos alimentícios associados ao vício em açúcar podem se tornar parte da rotina de atletas. No universo esportivo, onde a nutrição desempenha um papel crucial, a presença de alimentos altamente palatáveis e açucarados pode gerar complicações. Se atletas, influenciados por experiências passadas como a de Laura, recorrem a produtos alimentícios viciantes, como o doce de leite, em momentos de estresse ou ansiedade, isso pode impactar não apenas a saúde geral, mas também o desempenho esportivo. A associação entre alimentos açucarados e recompensa emocional pode criar um ciclo prejudicial, levando a escolhas alimentares pouco saudáveis. Seguir informações aleatórias de perfis no Instagram e adotar práticas alimentares ou de exercícios baseadas nas experiências de colegas de academia pode apresentar diversos problemas. Em primeiro lugar, a credibilidade e a qualidade das informações encontradas nas redes sociais podem variar significativamente, com algumas fontes fornecendo conselhos imprecisos ou não embasados cientificamente.


Para abordar esses problemas, é recomendável buscar orientação de profissionais de saúde, como nutricionistas e treinadores pessoais, que possam oferecer conselhos personalizados e baseados em evidências. Além disso, é fundamental manter uma mentalidade crítica em relação às informações encontradas nas redes sociais, considerando a fonte, verificando a validade científica e, sempre que possível, buscando orientação profissional.



JAYME ASSUNÇÃO

CRN 11090




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